Eu não sou inclinada a verdades absolutas, mas estou muito próxima a afirmar com toda convicção do meu ser: Satoshi Kon é meu diretor de animação favorito. Digo isso logo após terminar de ver seu segundo longa animado Millennium Actress, de 2001. Mel dels do céu, que filmeeee - eu tô que não me aguento!
Vamos para a sinopse da história (com uma ajudinha básica da wikipedia):
Chiyoko Fujiwara é uma atriz de sucesso aposentada, já nos seus ~70 anos. Genya Tachibana, um entrevistador e grande fã da atriz, e Kyoji Ida, seu cameraman, marcam uma visita para uma entrevista que busca fazer uma retrospectiva da vida e carreira de Chiyoko, que agora vive uma vida reclusa e sossegada. O entrevistador chega e entrega uma chave para ela, o que desperta nela diversas memórias do passado, a mais importante delas sendo de seu primeiro amor.
A partir do momento que Chiyoko começa a contar sua história, o filme se torna uma história dentro de uma história em que eventos da vida da atriz se entrelaçam com cenas de filmes em que ela apareceu, enquanto Tachibana e Ida aparecem acompanhando-a como documentaristas.
Uau. Só uau. Eu assisti esse filme depois de ter visto outros dois filmes do Kon, Perfect Blue e Paprika (e estou ignorando completamente o fato de que já tinha visto esse filme uns anos atrás quando minha noção de interpretação de histórias era do nível de uma alface), então já tinha certas expectativas. Mas eu não estava preparada o suficiente. Eu, inconscientemente, subestimei Satoshi Kon, mesmo já sabendo do que ele era capaz.
Não é só a história; se der uma olhada na ideia básica da coisa - uma atriz fazendo uma retrospectiva da sua carreira e refletindo sobre seu amor perdido -, não é algo exatamente original. Mas a construção dos acontecimentos, a forma da narrativa e as conexões entre as cenas causam uma total imersão na vida daquela mulher que dedicou sua vida à busca do seu verdadeiro amor. Você tá ali junto dela, super envolvido, querendo também mais que tudo encontrar o bendito do pintor que deixou a chave com a garota!
Essa ideia de jornada, da constante procura por algo que dê sentido à nossa vida me apareceu como a questão central do enredo. O final deixa isso bem claro nas próprias palavras da Chiyoko - que eu NÃO vou contar porque não quero dar spoiler e quero que todos assistam essa obra-prima da animação e do cinema - e te faz pensar: o que te move? O que faz valer a pena esse esforço de viver e correr atrás dos seus desejos? Alcançar os seus objetivos é o segredo para a verdadeira felicidade? Ou a vida é exatamente esse caminho que te leva para um ponto de chegada o qual não fazemos ideia de onde fica?
Tantas vezes em nossas vidas nós estabelecemos metas e decidimos que vamos focar naquilo para "aproveitar depois" - acreditando que a felicidade vai chegar assim que concluirmos aquela certa etapa. Mas talvez, apenas talvez, estejamos deixando passar a noção de que o que realmente importa é o processo contínuo em direção ao objetivo final - quem sabe se no fim do arco-íris existe mesmo um pote de ouro? Pode ser que a parte mais recompensadora do percurso tenha sido o prazer de correr por uma estrada colorida. Dá pra entender onde quero chegar? Espero que a metáfora não tenha sido tão brega assim, porque até que eu achei ela boa.
A todo momento eu fico embasbacada com a profundidade que Kon consegue inserir em seus filmes com uma sutileza sem igual. Uma parte de mim tem medo de estar envolta pelo calor do momento e despejar elogios e mais elogios e subir demais a expectativa de todo mundo que ler isso, para daí na hora que verem o filme não acharem lá essas coisas. Mas eu não consigo evitar, eu estou impressionada. Só tenham certeza de, na hora que forem assistir, estarem na melhor disposição e receptibilidade, porque Millennium Actress não é nenhum Xuxa e os Duendes né gente, e vai exigir um certo grau de sensibilidade e atenção - até porque com o Kon, se piscar por um tempo longo demais é capaz de você perder todo o significado profundo da cena! Estejam avisados! E bom proveito!!
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